Ventosaterapia
Tal como a moxabustão, a aplicação de ventosas ou ventosaterapia pode ser usada como complemento de outros tratamentos como Massagem Desportiva e tratamentos de estética segundo a Medicina Tradicional Chinesa, ou constituir em si mesmo um tratamento independente, com a vantagem de tratar um amplo espectro de patologias em sessões de curta duração. O tratamento consiste na aplicação de pequenos frascos que criam um efeito de sucção na pele por alguns minutos, estimulando a circulação sanguínea e drenando as toxinas acumuladas nos tecidos.
Breve História
Trata-se de uma técnica terapêutica cujo uso parece transversal a vários povos e civilizações e cuja origem pode mesmo remontar à Pré-História, conhecendo-se a sua prática no Médio e Extremo Oriente, assim como em África e na América Central.
Os registos mais antigos encontram-se no Egipto e na China. No Egipto, as ventosas eram usadas para tratar quase todas as doenças, documentando-se referências à sua prática e teoria no Papiro de Ebers, datado de cerca de 1550 a.C, assim como em várias representações parietais, como seja a do templo Kom Ombo.
Papiro de Ebers, considerado o mais antigo e importante papiro médico com mais de 700 fórmulas e prescrições.
Representação de ventosas e outros instrumentos médicos no templo de Kom Ombo, Egipto
Através do Egipto, a ventosaterapia chegou à Grécia Antiga, onde o uso de ventosas se documenta numa epígrafe do templo de Asclépio em Lebena, Creta, assim como numa longa lista de descrições exaustivas da sua aplicação terapêutica no Corpus Hipocrático, e na obra de Heródoto (Christopoulou-Aletra, 2008). Por influência grega tornou-se também uma terapia muito popular em Roma.
Na China Antiga, esta técnica parece ter sido inicialmente aplicada com cornos de animais, como aliás se continua a fazer actualmente em vários países asiáticos como a Tailândia e a Indonésia. Para criar a pressão negativa, introduz-se uma mecha acesa no corno que expele o ar. Este método terá sido usado inicialmente para retirar acumulações de sangue estagnado e pus, desenvolvendo-se posteriormente como terapia específica para tratar várias patologias.
Ventosaterapia com cornos de búfalo, Tailândia
Ventosaterapia com recipientes de bambu
Parecem existir algumas referências a esta prática no antigo corpus de medicina chinesa Huang Di Nei Jing, embora seja na dinastia Han (206 a.C.–220 d.C.) que aparece formalmente teorizada, conforme indica o livro Bo Shu. Registam-se casos do tratamento de tuberculose com ventosas em Weitaimiyao no ano 755, assim como de tosse crónica e dentadas de cobras no Susen Liang Fang, outra obra clássica escrita 300 anos depois.
Progressivamente, as antigas ventosas de cornos de animais foram sendo substituídas por recipientes de bambu, cerâmica e vidro, distinguindo-se dois tipos de recipientes: um de bordo estreito, usado para tratar acumulações de fluidos; e outro de bordo mais largo, destinado ao tratamento da dor.
No mundo Árabe este método era conhecido como Al-Hijama, sendo recomendado para um amplo conjunto de patologias por médicos célebres como Ibn Sina (980-1037), Al-Zahrawi (936-1036) e Abu Bakr Al-Razi (854-925).
Através do mundo Árabe, esta prática chegou à Itália Renascentista, difundido-se depois ao resto da Europa entre os séculos XIV e XVII, destacando-se a obra Opus Chyrurgicum, de Paracelso, escrita em 1565, onde se prescreve este tratamento para várias doenças. A terapia de ventosas tornou-se, na realidade muito popular, continuando a ser usada em mosteiros e por curandeiros até ao século XIX. Ainda em 1826, o cirurgião Charles Kennedy advogava os múltiplos benefícios da ventosaterapia.
No entanto, foi na China que esta terapia conheceu maior desenvolvimento, multiplicando-se os estudos clínicos a partir, sobretudo, da década de 1950, em parceria com equipas de investigação da antiga União Soviética.
Foi, porém, apenas muito mais tarde que a ventosaterapia voltou a difundir-se como técnica terapêutica no Ocidente, no âmbito das Medicinas Alternativas, a que recorrem cada vez mais pessoas, designadamente atletas e praticantes de desporto, pela sua eficácia no tratamento e alívio de dor e tensão muscular. Nas Olimpíadas de 2016, o aparecimento de vários atletas com marcas de ventosas, assinalou o crescimento da popularidade desta terapia, com destaque para o campeão de natação Michael Phelps.
Base teórico-científica
Embora lhe seja atribuído o efeito placebo pela Medicina Moderna, existe actualmente um vasto conjunto de estudos científicos que comprovam inequivocamente a sua eficácia terapêutica. No entanto, e apesar de existirem várias teorias explicativas, o mecanismo de acção concreto da ventosaterapia ainda não é totalmente claro.
Os principais mecanismos de acção envolvidos prendem-se com os efeitos da pressão de sucção subatmosférica exercida que promove a circulação sanguínea periférica e potencia o sistema imunitário. A estimulação cutânea provoca várias reações ao nível do sistema hormonal através do sistema nervoso autónomo e dos reflexos somatoviscerais. Os efeitos registados da aplicação de ventosas incluem alterações das propriedades biomecânicas da pele, o aumento da tolerância à dor, a melhoria do metabolismo anaeróbico local, a redução de inflamações e a modulação do sistema celular imunitário.
Entre as várias teorias explicativas sugere-se que a estimulação cutânea activa o sistema neuro-endócrino, o que promove a imuno-modelação; que o stress cutâneo induzido pela pressão negativa e a privação local de oxigénio desencadeia vários sinais que podem activar ou inibir expressões genéticas, como documentado em vários estudos; que a libertação de óxido nítrico promovido por essa estimulação local assiste no relaxamento muscular e na activação da circulação sanguínea; assim como o aumento da produção de opióides endógenos que intervêm no controle da dor. Por outro lado, a estimulação da micro-circulação promove a reparação das células capilares endoteliais, ajudando ao relaxamento muscular e à expulsão de toxinas acumuladas.
A investigação desenvolvida indica que a técnica de ventosas parece ser muito eficaz na redução de lipoproteínas de baixa densidade, assim como dos níveis de colesterol e lipoproteínas de alta densidade, com o consequente efeito preventivo da ateroesclerose e doenças cardiovasculares. Esta terapia diminui igualmente o número de linfócitos no sangue local da área afectada e o aumento de neutrófilos, o que corresponde a um dos mecanismos antivirais que reduzem a dor. A vaso-dilatação provocada tende a aumentar também a actividade parassimpática, promovendo o efeito de relaxamento.
Benefícios
• Alívio da dor músculo-esquelética
• Melhoria da circulação sanguínea
• Prevenção de doenças cardiovasculares
• Eliminação de toxinas acumuladas nos tecidos
• Revitalização do tecido conectivo
• Estímulo e reequilíbrio do sistema nervoso periférico
• Modulação do sistema imunitário
• Efeito anti-inflamatório
• Recuperação dos tecidos
Indicações
• Dores musculares
• Dores articulares
• Lombalgia e Ciática
• Fibromialgia
• Síndrome do Canal Cárpico
• Paralisia facial
• Hipertensão arterial
• Diabetes
• Artrite reumatoide
• Cefaleia
• Doenças pulmonares
• Asma, Tosse
• Redução de celulite e gordura localizada
Contra-indicações
A ventosaterapia é absolutamente contra-indicada em casos de cancro ou falência de órgãos; insuficiência cardíaca; tuberculose pulmonar; doenças hemorrágicas; doenças infecciosas agudas; hipertermias; ulcerações da pele e alergias cutâneas; nódulos linfáticos; casos agudos de astenia; em grávidas antes de 100 dias de gestação; no período puerpério e durante a menstruação.
Em que consiste uma sessão de Ventosaterapia
A consulta é iniciada com a observação do paciente e várias perguntas de diagnóstico, procedendo-se depois ao reconhecimento das zonas em desequilíbrio, com o paciente deitado numa marquesa ou sentado, consoante os casos. Após identificados os pontos em desequilíbrio, procede-se ao tratamento que dependerá de cada paciente e do quadro clínico que se apresente.
O procedimento terapêutico pode incluir diferentes técnicas, adaptadas a cada caso e paciente: a chamada técnica flash, em que a ventosa é colocada e retirada de imediato, que estimula rapidamente a circulação sanguínea e prepara a pele para os processos seguintes; e a ventosa fixa, colocando-se o recipiente nos pontos a tratar até se registar congestão na zona.
Outra técnica é a da ventosa móvel, sendo o recipiente aplicado sobre a pele previamente friccionada com óleos terapêuticos e mobilizando-se a sucção ao longo dos tecidos congestionados, particularmente eficaz em contracturas musculares e nos tratamentos anti-celulite.
O procedimento é indolor. O paciente pode experienciar uma sensação de leve ardor ou calor nos locais de aplicação, embora na maioria dos casos a sensação seja de alívio imediato.
O efeito secundário mais frequente e desejável são as características marcas de sucção que podem durar entre 3 e 7 dias e não requerem qualquer tratamento. Nalgumas situações, porém (sobretudo em patologias crónicas) podem registar-se a formação de bolhas à medida que os elementos tóxicos são drenados através do tecido cutâneo, as quais, porém, têm rápida cicatrização e indicam que o tratamento foi eficaz.
Os efeitos adversos que, por vezes, são imputados à ventosaterapia derivam de procedimentos incorrectos, seja a nível da duração exagerada da aplicação, seja ao nível da incorrecta esterilização dos instrumentos terapêuticos. Quando executado correctamente, trata-se de um procedimento seguro, indolor e sem efeitos secundários. Recomenda-se repouso ou, pelo menos, evitar esforços depois da sessão.
Preço
30€
Artigos Científicos
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